CASA DA TIA CIATA, CAIS DO VALONGO E "PEQUENA ÁFRICA"
© Rafa Jacinto / Fundação Bienal de São Paulo
Na virada do século 19 para o 20, com o recente fim da abolição e a incipiente República no Brasil, inicia-se um processo que assume o Rio de Janeiro, então nova capital do país, como o maior símbolo da identidade nacional.
Tia Ciata, como ficou conhecida Hilária Batista de Almeida (1854-1924), compõe, com outras “tias”, um grupo potente de mulheres negras que chegam à cidade, no movimento da diáspora baiana, que encontravam no território da Praça Onze uma forma de existir mais banta, iorubá, jeje – mais africana.
Dentro de uma simples “casa-corredor”, situada em uma região de grande efervescência social e cultural negra – mais tarde conhecida como “Pequena África” – revela-se, para além da arquitetura, uma forma de existir afro-brasileira que precisava estar escondida e protegida, pois era alvo de investidas violentas da polícia e do Estado.
Em camadas, ou em cômodos, Tia Ciata organiza o sistema político-cultural que vai fazer com que a cultura negra – religiosa, artística, gastronômica – se revele aos poucos a quem era permitido ali adentrar. Esse sistema faz com que a arquitetura da casa da Tia Ciata, apesar de ter virado ruína, seja um símbolo de resistência das populações afro-brasileiras, tal o samba, que dali surgiu.
Tia Ciata, como ficou conhecida Hilária Batista de Almeida (1854-1924), compõe, com outras “tias”, um grupo potente de mulheres negras que chegam à cidade, no movimento da diáspora baiana, que encontravam no território da Praça Onze uma forma de existir mais banta, iorubá, jeje – mais africana.
Dentro de uma simples “casa-corredor”, situada em uma região de grande efervescência social e cultural negra – mais tarde conhecida como “Pequena África” – revela-se, para além da arquitetura, uma forma de existir afro-brasileira que precisava estar escondida e protegida, pois era alvo de investidas violentas da polícia e do Estado.
Em camadas, ou em cômodos, Tia Ciata organiza o sistema político-cultural que vai fazer com que a cultura negra – religiosa, artística, gastronômica – se revele aos poucos a quem era permitido ali adentrar. Esse sistema faz com que a arquitetura da casa da Tia Ciata, apesar de ter virado ruína, seja um símbolo de resistência das populações afro-brasileiras, tal o samba, que dali surgiu.
At the turn of the 19th to the 20th century, with the recent end of abolition and the incipient Republic in Brazil, a development began that saw Rio de Janeiro, then the country's new capital, become the most important symbol of national identity.
Tia Ciata, as Hilária Batista de Almeida (1854-1924) was known, together with other "aunties", made up a powerful group of Black women who arrived in the city as part of the Bahian diaspora movement, and who found in the Praça Onze area a more Banta, Yoruba, Jeje—more African—way of living.
A simple “corridor-house”, located in a region of great Black social and cultural effervescence—later known as "Pequena África” [Little Africa]—reveals inside, beyond its architecture, a form of Afro-Brazilian existence that needed to be hidden and protected, as it was the target of violent attacks by the police and the State.
In layers, or in rooms, Tia Ciata organized the political-cultural system that would make Black culture—religious, artistic, gastronomic—reveal itself little by little to those who were allowed to enter. This system means that the architecture of Tia Ciata's house, despite having become a ruin, is a symbol of resistance of the Afro-Brazilian populations, as with samba, which emerged from there.
Tia Ciata, as Hilária Batista de Almeida (1854-1924) was known, together with other "aunties", made up a powerful group of Black women who arrived in the city as part of the Bahian diaspora movement, and who found in the Praça Onze area a more Banta, Yoruba, Jeje—more African—way of living.
A simple “corridor-house”, located in a region of great Black social and cultural effervescence—later known as "Pequena África” [Little Africa]—reveals inside, beyond its architecture, a form of Afro-Brazilian existence that needed to be hidden and protected, as it was the target of violent attacks by the police and the State.
In layers, or in rooms, Tia Ciata organized the political-cultural system that would make Black culture—religious, artistic, gastronomic—reveal itself little by little to those who were allowed to enter. This system means that the architecture of Tia Ciata's house, despite having become a ruin, is a symbol of resistance of the Afro-Brazilian populations, as with samba, which emerged from there.
© Rafa Jacinto / Fundação Bienal de São Paulo
Thierry Oussou, What is left of the sugar cubes?, 2019, video , 9'48"
O artista beninense Thierry Oussou reflete sobre as terras do Cemitério dos Pretos Novos, onde foram enterrados os corpos de cerca de 40 mil africanos escravizados, e sobre as ruínas do Cais do Valongo, onde desembarcaram mais de 1 milhão de africanos, sítio arqueológico reconhecido pela Unesco. “Descobertos” durante projetos de reformas urbanas no centro do Rio de Janeiro em 1996 e 2011, estes sítios evidenciam o maior complexo escravagista das Américas. Reivindicadas como memoriais pelo movimento negro durante anos, marcam a presença da ancestralidade afro-brasileira, suas culturas, religiões e formas de resistência. O filme de Oussou levanta uma reflexão sobre o processo de preservação de um patrimônio esquecido para compreender apagamentos e continuidades do passado no presente.
O artista beninense Thierry Oussou reflete sobre as terras do Cemitério dos Pretos Novos, onde foram enterrados os corpos de cerca de 40 mil africanos escravizados, e sobre as ruínas do Cais do Valongo, onde desembarcaram mais de 1 milhão de africanos, sítio arqueológico reconhecido pela Unesco. “Descobertos” durante projetos de reformas urbanas no centro do Rio de Janeiro em 1996 e 2011, estes sítios evidenciam o maior complexo escravagista das Américas. Reivindicadas como memoriais pelo movimento negro durante anos, marcam a presença da ancestralidade afro-brasileira, suas culturas, religiões e formas de resistência. O filme de Oussou levanta uma reflexão sobre o processo de preservação de um patrimônio esquecido para compreender apagamentos e continuidades do passado no presente.
Thierry Oussou, What is Left of the Sugar Cubes?, 2019, video, 9'48"
The Beninese artist Thierry Oussou reflects on the grounds of the Cemitério dos Pretos Novos, where the bodies of some 40,000 enslaved Africans were buried, and on the ruins of the Cais do Valongo, an archaeological site recognised by UNESCO, where over 1 million Africans docked. “Discovered” during urban renovation projects in downtown Rio de Janeiro in 1996 and 2011, these sites highlight the largest slave complex in the Americas. Claimed as memorials by Black movements for years, they mark the presence of Afro-Brazilian ancestry, their cultures, religions and forms of resistance. Oussou's film reflects on the process of preservation of a forgotten heritage in order to understand the erasures and continuities of the past in the present.
The Beninese artist Thierry Oussou reflects on the grounds of the Cemitério dos Pretos Novos, where the bodies of some 40,000 enslaved Africans were buried, and on the ruins of the Cais do Valongo, an archaeological site recognised by UNESCO, where over 1 million Africans docked. “Discovered” during urban renovation projects in downtown Rio de Janeiro in 1996 and 2011, these sites highlight the largest slave complex in the Americas. Claimed as memorials by Black movements for years, they mark the presence of Afro-Brazilian ancestry, their cultures, religions and forms of resistance. Oussou's film reflects on the process of preservation of a forgotten heritage in order to understand the erasures and continuities of the past in the present.